Resenha: Paperboy




Título: Paperboy
Autor(a): Pete Dexter
Editora: Novo Conceito
ISBN: 9788581632186
Páginas: 336
Ano: 2013
Skoob
Hillary Van Wetter foi preso pelo homicídio de um xerife sem escrúpulos e está, agora, aguardando no corredor da morte. Enquanto espera pela sentença final, Van Wetter recebe cartas da atraente Charlotte Bless, que está determinada a libertá-lo para que eles possam casar.
Bless tentará provar a inocência de Wetter conquistando o apoio de dois repórteres investigativos de um jornal de Miami: o ambicioso Yardley Acheman e o ingênuo e obsessivo Ward James.
As provas contra Wetter são inconsistentes e os escritores estão confiantes de que, se conseguirem expor Wetter como vítima de uma justiça caipira e racista, sua história será aclamada no mundo jornalístico.  
No entanto, histórias mal contadas e fatos falsificados levarão Jack James, o irmão mais novo de Ward, a fazer uma investigação por conta própria. Uma investigação que dará conta de um mundo que se sustenta sobre mentiras e segredos torpes.  
Paperboy é um romance gótico sobre a vida aparentemente sossegada das cidades do interior. Um thriller tenso até a última linha, que fala de corrupção e violência, mas que, ao mesmo tempo, promove uma lição de ética.

Com o filme chegando a alguns cinemas brasileiros essa semana (lá fora ele já estreou a quase um ano; só um pouco atrasado por aqui, né?) achei que seria interessante resenhar Paperboy. A sinopse me vendeu a imagem de uma trama cheia de investigação, suspense e reviravoltas. Mas aí está o primeiro problema com esse livro, a sinopse mentirosa.
Eu estava sentado na zona de carga e descarga, vigiando a chegada de outros veículos de entregas havia tanto tempo que um cachorro ofegante veio se deitar sob a sombra do caminhão para descansar.
Página 46
Paperboy têm alguns momentos de tensão, isso é certo, mas com certeza não é nenhum "thriller tenso até a última linha". E se existe uma "lição de ética" em algum lugar nesse livro, mal aí, mas eu não captei (e alguém por favor me explique o que é um "romance gótico"). Outras mentiras da sinopse eu não posso revelar sem dar spoiler do livro, mas posso dizer que pelo menos o básico está certo. É uma história sobre dois jornalistas que pretendem escrever uma matéria relatando como um homem foi falsamente acusado de homicídio pelo simples fato de ser mal visto na região, na esperança que essa matéria ajude a revelar a verdade e que o homem seja solto, para assim poder se casar. Se isso for o suficiente para ganhar o seu interesse, então continuemos.

A trama em si é boa. Bem amarrada e instigante, porém sofre um pouco com seu ritmo lento. A princípio pensei que o livro apenas estava demorando para chegar ao ponto, mas no final descobri que ele simplesmente não tem um ponto. Por ponto eu me refiro ao momento no qual a mensagem da obra é revelada, a mensagem que o autor quis passar com tudo o que foi escrito. Paperboy é apenas uma boa história sem grandes pretensões; isso é reforçado pelo fato de o livro não possuir capítulos. É um único bloco de texto de 336 páginas, com várias pausas espalhadas em seu miolo.

Não acho que a despretensão e lentidão do livro atrapalhem tanto. Ser despretensioso acaba tornando a leitura fácil e prazerosa, o que por sua vez ajuda a ignorar a lentidão. No entanto, Paperboy sofre muito mais com dois sérios problemas: seus personagens e seus diálogos.
- Eu sei quais são os seus limites - disse ele, e Charlotte enrubesceu.
Página 159
Os personagens aqui são extremamente unidimensionais. É difícil se surpreender com qualquer coisa que eles façam ou falem depois que se conhece um pouco deles. A impressão é a de que cada um tem o seu papel nessa história e deve se ater a ele com todas as forças. Dito isso, existe um acontecimento mais ou menos na metade do livro que causa uma certa mudança em um dos personagens principais, mas essa mudança ocorre tão lentamente que acaba sendo quase imperceptível, mesmo sendo importante. Mas pelo menos é um pouco de ar fresco nesse mundo de pessoas estéreis.

Falando em pessoas estéreis, o suposto personagem principal, Jack James, é de longe o pior de todos. Se os outros são unidimensionais, Jack é puro vácuo. Ele têm todas as características associadas a homens nos seus vinte anos (o que basicamente significa que ele está excitado o tempo todo, mas quase nunca sabe como responder a situações novas) e age como o narrador-personagem, mas fora isso eu sinceramente não sei o que dizer sobre ele. Não é nem questão de ele ser contraditório ou anormal, ele simplesmente não tem personalidade. Muitas vezes parece que ele só está ali para narrar a cena para nós e sua presença seria completamente inútil se não fosse por isso. Chega a ser irônico um personagem que por tantas vezes é mostrado como se tivesse o ímpeto de um cavalo selvagem (e ainda é nadador) ser assim tão oco.

Para terminar a resenha aqui vai o que julgo ser o maior problema de Paperboy, os diálogos. Existe um recurso narrativo muito comum que talvez até tenha um nome, embora eu desconheça, que é colocar informação implícita dentro de um diálogo. Ou seja, o que é dito pelos personagens não é apenas literal, mas tem um significado a mais. Pode ser uma informação, uma reflexão, uma confissão, qualquer coisa. O autor Paul Dexter usa esse recurso razoavelmente bem em algumas ocasiões, mas o que atrapalha, e muito, é que ele usa esse recurso exaustivamente. Pelo menos metade dos diálogos é esquisito e não soa natural, mesmo quando envolve personagens secundários que só aparecem naquelas poucas páginas e depois somem.

Muitas vezes parece que os participantes da conversa estão falando mais consigo mesmos do que com os outros, ao ponto da cena ficar esquizofrênica. Nesse esforço para o que eu imagino tenha sido dar um pouco mais de complexidade para seus personagens, Paul Dexter só conseguiu com que cada um deles se perdesse em seu próprio mundinho particular, plano e sem graça.

Apesar de todos esses problemas não me arrependo de ter lido Paperboy. Não por seus personagens nem por qualquer coisa que talvez tenha tentado passar, mas por ser uma trama simples, fácil e prazerosa. Não digo que é um livro bom, mas também não o acho ruim. Talvez seja algo para se ler quando não se está a fim de ler nada.

E para os aspirantes na área de jornalismo eu deixo uma recomendação a mais, pois o livro é recheado de detalhes sobre como funcionavam os jornais naquela época (anos 70), nos EUA. Não que ele seja uma aula de redação de notícias, mas para quem se interessa eu imagino que vá gostar.

P.S.1: O livro contém linguagem chula em demasia (embora não de maneira forçada) e referências a atos sexuais, portanto não aconselho para crianças ou quem não goste desse tipo de linguagem.

P.S.2: O filme no Brasil ganhou o título de "Obsessão". Eu quase consigo imaginar o porquê de um título tão diferente do original, mas não gostei mesmo assim. Custava colocar como "O Jornaleiro"?

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